Os Julgamentos do Povo no Pós-Comunismo
Em Portugal tem se escrito muito pouco sobre a detenção de Radovan Karadzic. Tal é normal numa nação dormente em que o “canudo” se ganha por absorção de uma mensagem e não pelo estudo rigoroso de problemas. Num país com milhares de licenciados em Relações Internacionais não há uma voz discordante, não há uma reflexão sobre a legitimidade de instituições “neutras”, não existe alguém que questione como é que no caso da “pequena Maddie” todos sejam inocentes até prova em contrário e como é que se prepara uma repetição na Haia do sucedido com Milosevic.
Há um equívoco enorme nos nossos dias criado pela “mentalidade dicotómica”: ou se defendem os tribunais internacionais ou se pactua com os crimes de guerra. Esta ideia reflecte uma concepção ridícula de Justiça que se apoia em premissas grosseiras, que seriam humorísticas se não fossem tão perigosas.
O internacionalismo da decisão judicial como característica legitimadora ou geradora de uma melhor decisão (mais próxima da verdade) é ridículo e lembra os tribunais populares do PREC em que a inclusão da decisão a santificava, mesmo quando eram visíveis erros grosseiros. Para mais, a ideia de que a norma internacional, porque partilhada, consentida e pactuada por todos os Estados, reflecte algo superior aos interesses do forte e tem um carácter que lhes é superior (nem todos os conjuntos são superiores à soma dos seus membros), é também ridícula, sabendo nós que o entendimento que lhe subjaz é tudo menos uma reflexão ou aceitação de normas de justiça, mas uma troca de favores e lealdades por dinheiro e apoios, que faz dessa justiça uma anedota. Um tribunal militar americano seria muito mais justo que este simulacro.
Constituir um tribunal internacional é apenas uma tentativa de disfarçar a justiça parcial sob a guisa de uma aceitabilidade geral. Existisse uma verdadeira “comunidade internacional” e todos os países e respectivas opiniões públicas, estariam felizes e a dizer “já apanhámos Milosevic e Karadzic, agora falta apanhar os criminosos bósnios e croatas” que procederam a violações sistemáticas e a homicídio de não-combatentes. Sobre isto, nada. As indignações selectivas do costume.
Para além disso, a Nova Sérvia demonstra não ser um país de confiança, porque aceita a incapacidade da sua estrutura judicial para julgar um presumível criminoso e prostrando-se perante os donos do entendimento internacional que lhe infligiram a sua mais recente amputação.
Deve ser esta a elite pró-europeia que recebe a confiança dos nossos governantes…
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