domingo, outubro 18, 2009

Liberdades Civis
















Há tempos andava a a discutir o problema da sociedade civil com um amigo e professor. Este insistia que tudo o que não era sector estatal e tinha finalidades públicas seria considerado sociedade civil. O ponto era interessante, repleto de subentendidos hegelianos, mas completamente desfasado do modelo de Estado que temos. Como poderá este modelo de Estado Democrático, uma máquina vazia que apenas reconhece como elemento público a manutenção de esferas de individuais e em que todos os sentidos colectivos são preenchidos com a vontade do soberano colectivo, reconhecer em associações privadas as finalidades que o próprio se recusa a aceitar? Aceitar esta perspectiva implica tomar como elementos da sociedade civil as empresas ou sindicatos (que agem segundo o seu interesse próprio), uma associação de incentivo ao suicídio colectivo, uma sociedade de defesa da pornografia infantil. Onde nada exista de público, tudo aquilo que seja ou se mascare de interesse pela colectividade pode ser aceite como sociedade civil.
Claro está que esta sociedade civil nada tem a ver com aquele elemento que Tocqueville considerava preponderante na manutenção de um sistema de liberdade dentro do Estado Moderno. As associações humanitárias que lutam por direitos sociais e não fazem mais que pugnar pela destruição de todas as outras perspectivas culturais que sobrepõem uma concepção de Bem ao mando, são os principais opositores dessas instituições sociais, simplesmente por defenderem a total subordinação à fonte de poder por estas defendido. Esta posição é precisamente o inverso do que a sociedade civil originalmente é e corresponde a algo muito semelhante ao que sucede no poder autárquico actualmente, a transformação dos privados em servidores públicos.
Tocqueville apresenta a sociedade civil como fundamento da liberdade moderna, demonstrando como só numa sociedade com posição sobre o mal e o bem pode haver uma liberdade compatível com a reponsabilidade. Algo que é completamente estranho à sociedade civil actual e ao seu ritualismo da tolerância, a sua obsessão com a inserção incondicional do Outro, óbvio reflexo da impessoalidade e ausência de critério do Estado Moderno e seu sistema de crenças. Mas o que Tocqueville esqueceu foi a forma como a sociedade civil só pode existir num contexto de definição de bens exteriores aos sujeitos, mas que tem existência real e precedente à realidade política. Tal só pode ocorrer quando o Estado apercebe uma estrutura natural e assume que a sua própria criação só existe num contexto de aceitação de finalidades naturais e não políticas. A autarquia, a associação profissional, a família, só podem ter existência livre quando submetidas a finalidades que transcendem o Estado, mas que encontram neste o reconhecimento do seu carácter imperativo. Só podem ser livres se aceitarem o Bem (a família tem de acreditar que a educação tem valor, p.ex.), se o Estado aceitar as suas limitações naturais, se a sociedade descriminar entre as associações boas e as de malfeitores. Um equilíbrio mais complexo do que se pensa geralmente.

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