Confusão de Vontades
Há um comentário sistemático por parte de Vitorino, Marcelo, Portas e Sócrates que retrata o resultado das eleições como uma expressão dos Portugueses ou do Povo. Dizem que os portugueses escolheram dar maioria a um, não dar a outro, não dar poder à esquerda e dar à direita. Trata-se de algo ridículo, um pensamento herdado de tempos em que o constitucionalismo pretendia ser uma voz da Nação e em que esta se sobrepunha à posse individual da comunidade. Num sistema onde o indivíduo é soberano e onde o voto é único (não existe, como noutro tipo de eleições, um número de votos ao dispôr do eleitor para distribuir pelas várias forças), afirmar que os portugueses não quiseram dar maioria ao PS, que quiseram dar a Portas um lugar activo na política, que penalizaram Manuela Ferreira Leite, é algo absolutamente abusivo e incompreensível. A única interpretação que se pode fazer é que x pessoas estiveram dispostas a ceder o seu voto ao partido y. Quando os votantes das legislativas anteriores votaram no PS, provavelmente apenas uma pequena percentagem pretendia que esse partido tivesse uma maioria absoluta. E as interpretações generalizadas foram de que os portugueses tinham pretendido dar uma maioria ao PS, como se houvesse uma inteligência ou uma vontade superior num conjunto de resultados desconexos. Como se num acto de delegação generalizada de poderes individuais houvesse um desejo da comunidade em criar uma maioria. Isso é uma simples manipulação, uma tentativa de encantamento da democracia através da criação de conceitos míticos herdados de tempos em que as opções eleitorais eram mais do que expressões de preferência individual.
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