quarta-feira, abril 30, 2008

O Alcance de Hayek














É muito interessante ler o que o RA aqui escreve. O liberalismo fundar-se-ia nas tradições e não subsistiria sem um paradigma moral. Acho muito bem, mas será que se poderá chamar a isso liberalismo? Imagine-se que as tradições de um povo mandavam fazer uma redistribuição de riqueza em casos pontuais (como faz o Cristianismo). O que prevalecerá, a Propriedade ou a Tradição? Se o liberalismo está desligado do papel preponderante da Vontade e se se funda apenas numa forma mais eficaz de gestão da coisa pública dentro de um paradigma tradicional, falta saber porque é que andámos dois séculos em conflito entre o Liberalismo e a Tradição…

Mais importante, quando o RA afirma que o liberalismo se funda na tradição evolucionista cria um problema que torna impossível qualquer liberalismo, ao criar um critério de evolução da moral que terá de ser foco da reflexão da comunidade. Há duas hipóteses para isto. Ou critério para o progresso da tradição é a sua aproximação à Verdade (o que obriga a uma submissão a princípios externos à população e até à própria comunidade política), ou então essa evolução tem como único critério a prática da população (o que permite, em caso de concordância da maioria, comer o vizinho ou proceder à eutanásia). A sociedade tem de escolher…
Fica-se sem saber como se pode numa sociedade liberal, escolher uma concepção moral que esteja acima da comunidade e não seja meramente funcionalista.

Se a sociedade humana resulta de uma selecção espontânea de procedimentos convenientes à espécie, conviria perceber porque razão é que seres humanos resolveram legitimar práticas como o homicídio ritual, o incesto religioso dos líderes, o canibalismo. Que ponto de vista pode legitimar a rejeição de tais práticas, frutos claros da ordem espontânea?
O RA arranja uma boa solução: a desumanização dos canibais, já utilizada com tão bons resultados contra judeus e inimigos do povo no século passado, não vale. O que valia a pena era explicar qual o critério para determinar a humanidade de alguém e se o liberalismo está apto a elaborar reflexões sobre esses temas. E no caso do pensamento liberal ser incapaz de se pronunciar sobre essas matérias, resta saber porque razão uma reflexão de curto alcance se arrogou a elemento constitutivo da sociedade.

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