segunda-feira, dezembro 05, 2005

A Águia Bicéfala

O CDS tem sido, desde que ganhou tiques de “partido de poder”, uma eterna luta de poder. As cisões verificadas, por serem em torno de pessoas e não de projectos, manifestaram-se incapazes de trazer alguma paz a qualquer dos grupos.
O que se observa hoje no CDS é o mesmo que se verifica em qualquer partido que tem os olhos nos cargos, na retribuição da dedicação à causa a expensas do erário. As ideias perderam-se no caminho. O CDS de Monteiro era ingénuo, por vezes obtuso, mas tinha uma clara agenda de direita. O CDS de Portas era manhoso, mas sacrificou a agenda de direita e as réstias ideológicas para se tornar num Partido Popular, um “catch-all”.
Disse-se conservador no início, democrata-cristão a meio... e no fim de contas nunca foi qualquer das duas!
A grande barricada no CDS (assim como no PND que é a mesma coisa, mas sem história e em pequenino) não é a confusão ideológica, mas entre os que os consideram que as ideias são importantes e os que fogem delas como o diabo da cruz.
Li aqui há tempos no Lóbi do Chá este sintomático texto sobre os conflitos de Poder no seio do CDS. A perspectiva é clara. Há uns tipos esquisitos e pouco práticos que andam por aí a pulular no partido... monárquicos, fascistas e beatos! O que é preciso é correr com essa malta (ou calá-los), para que o CDS cumpra a sua função de partido da classe-média (desígnio similar ao do PND quando se apresentou ao eleitorado)...
A definição do partido viria através de uma fórmula mágica.

“...o CDS é liberal, é democrata-cristão, é conservador e também é socialista. O CDS é verdadeiramente o centro democrático e social. Qualquer tentativa de o reduzir a uma ideologia, é uma forte estocada na amplitude ideológica desejada desde a Declaração de Princípios. Aliás, um partido não se pode fechar numa só ideologia: isso é para as associações de radicais. O CDS deve ser liberal quando se trata de defender a propriedade privada, o investimento e a redução do peso do sector público; deve ser socialista quando se trata de distribuir riqueza de forma justa e equitativa, para proteger os desafortunados e promover uma sociedade equilibrada; deve ser conservador quando se trata de defender intransigentemente os valores sociais que estão debaixo de fogo. O CDS deve ser tudo isto e muito mais. Nunca muito menos.”

Esta fórmula poderia ser mote de qualquer partido socialista, social-democrata ou popular da Europa. Nada diz sobre nada. Não explica em que se fundamenta o exercício do Poder, em que estrutura uma futura acção governativa. Em vez disso faz o apelo à defesa das classes médias (expediente usado por todos os partidos, do PCP ao PSD).
O que dirá esta defesa das classes médias do Rendimento Social de Inserção, do Aborto, do direito à educação gratuita incluso na Constituição? Nada! Nem interessa que diga...
Esta forma de fazer política não tem ideias, credos ou propostas. Limita-se a exprimir o que vai pela sociedade. Numa sociedade anti-semita defenderia o anti-semitismo. Numa sociedade onde se poderia abortar até à maioridade defendê-lo-iam até que a classe média deixasse de o defender! Um Partido Popular é, por isso, uma triste sequela do PS e do PSD e aí reside a razão da forma como Paulo Portas, não vendo capacidade de afirmar princípios de direita e manter o “canto de sereia” ao eleitorado classe-média, investiu na ideia de “os nossos tecnocratas são melhores que os deles!”.
Este é o conflito que existe entre a liderança e o grupo parlamentar do CDS.
Quanto mais depressa o CDS perceber que na classe média não há nicho de mercado, mas que a razão é terra virgem no panorama português, mais probabilidades de sobrevivência terá...
Para já a coisa não está fácil!

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