quinta-feira, novembro 24, 2005

Abrir a Igreja, Perder a Palavra

Recebendo honras de abertura nos canais de TV a Igreja Católica emitiu um documento que visa vedar a entrada na carreira sacerdotal de homossexuais. Tarefa ciclópica, ao que me parece. Há, contudo, uma medida que me parece ser de importância preponderante no combate à infiltração da sodomia nos muros de São Pedro. A partir de agora a entrada em seminários católicos está vedada, não apenas aos sodomitas, mas aos que professem a tolerância com tais práticas.
Acho notável que uma situação que deveria ser óbvia em todas as instituições (que exista concordância nos pressupostos básicos dos membros com a estrutura que a constitui) seja manchete de telejornais. Talvez a nossa sociedade, cativa de um concepção errónea de pluralismo, onde não existe lugar para uma “ideia directriz”, um propósito fundamental e fundamentador, encontre surpresa numa instituição que ainda tem critérios de admissão.
A mentalidade moderna impele o sacrifício da identidade (ou “constituição”, ou “essência”) ao altar dos números e recursos. A Igreja deveria destruir a sua essência, de modo a recrutar mais membros para o seu seio.
É nesse processo que a instituição se deteriora.
Rapidamente a instituição é esvaziada do seu conteúdo essencial (tradições, instituições, regras de pertença, mínimos de concordância, estrutura hierárquica, “telos”), dando lugar a um conjunto de crenças e justificações que a destroem.
A situção da Igreja é muito semelhante à das nações europeias no século XVII e XVIII.
Como bem observaram Burke, Voegelin, Burkhart, a Revolução não começa em França, nem sequer com Rousseau, Voltaire e D`Alembert, mas com a Reforma.
As “ideias modernas” atacaram a concepção de integralidade das “constituições históricas”. Substituíram os alicerces tradicionais das sociedades por uma obediência cega e inquestionável ao Rei (despotismo iluminado), às maiorias (soberania popular), aos consensos (vontade geral). Com isso despreza a integralidade da existência de uma comunidade por um símbolo parcial. Essa parcialidade conduz rapidamente à subversão da vida da comunidade, à desagregação das crenças que permitem um “sentido de justiça”, submetendo-as às concepções dominantes, do Poder e da Sociedade.
A perda da essência de uma instituição implica a sua igualitarização a todas outras instituições que se encontram em estado semelhante de degradação. Sem “telos” e tradições nada distingue uma instituição das outras. A instituição fica refém da vontade de seus membros. Daí a que a Igreja passe a associação filantrópica, a assembleia de culto, a sociedade anónima desportiva, resida apenas num acto de seus membros.
Sem o repositório tradicional e institucional das constituições não há resistência possível à dominação ideológica.
Essas são as razões de tanto escândalo!
Uma instituição que parece recomeçar a blindar-se contra a ditadura secularizante que só admite a pluralidade no âmbito de instituições vazias de tradições, de instituições de portas escancaradas à destruição dos seus próprios princípios. Quem se esquecer da discussão sobre a estrutura interna dos partidos e da iniciativa do Bloco Central em impor uma estrutura interna (democrática) a todos os partidos, não poderá compreender que tipo de pluralismo é defendido pelos donos da democracia portuguesa.

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