A Voz do Diabo
Foi com enorme gosto que vi dois textos meus publicados no semanário O Diabo.
Gosto redobrado por me encontrar entre textos acutilantes de Soares Martinez, Walter Ventura, de uma excelente recensão de Pinharanda Gomes...
Saliento ainda uma magnífica entrevista do Professor Veríssimo Serrão onde traça os erros estruturantes da democracia portuguesa e se centra, curiosamente, nas mesmas questões que focámos nos textos publicados.
O primeiro dos textos publicados por O Diabo pode ser lido aqui.
O segundo texto é o que se segue.
Os Paradoxos do Regime
No regime social-democrata que nos norteia existe um conjunto de adjectivos derrogatórios que têm como intuito afastar os visados do eixo de entendimento “politicamente correcto”. Seja o “fascista”, o “demagógico”, o “conservador”, todos servem para repelir o alvo, seja do consenso dos noticiários, dos “talk-shows” conduzidos por iletradas (sempre repletos de citações famosas), dos jornais dirigidos a futuros pertencentes da classe média, sempre ávidos de ecoar as últimas mediocridades e chavões dos seus medianos ídolos.
Nos últimos tempos surgiu o impensável.
Há cerca de dois anos Pacheco Pereira iniciou uma caça aos “populistas” da cena política nacional. Paulo Portas por um certo apelo nacional-cristão, Santana Lopes por uma “sede desmedida de poder pessoal”, mereceram o epíteto.
As considerações, amplamente difundidas pela comunicação social, revestem-se de uma bizarria quase anedótica.
O populismo é, por definição, concepção subjacente a qualquer regime social-democrata, uma vez que identifica o fundamento da comunidade com a causa do povo, com as suas condições de vida, com a igualdade (ou igualitarização material), com a identificação do público com o privado. O retrato perfeito do nosso regime!
A celeuma não pode, portanto, ser quanto à distribuição de dinheiros públicos em habitação gratuita, em incentivos à indigência e marginalidade, sejam eles designados por rendimentos mínimos ou sociais de inserção, ou apoio aos que voluntariamente se colocaram à margem da sociedade por via de crime, toxicodependência, ou associabilidade, uma vez que este é o principal traço do nosso desgoverno.
Não se compreende a surpresa nas últimas eleições autárquicas, pelas vitórias de Felgueiras, de Gondomar e Oeiras. Os “papões” que venceram o regime são a essência do próprio regime. Em nada diferem das posições partidárias, no propósito de dizimar dinheiros públicos em troca dos tão necessários votos. Isto tudo com o beneplácito maquiavélico dos que reduzem a acção política a uma busca de apoios “com vista à aquisição, manutenção e exercício do Poder”.
Nem se pode afirmar que seja uma questão de legitimidade e lisura, pois que muitos dos candidatos-arguidos menos mediáticos se mantiveram nas listas dos partidos para as autárquicas (em juntas de freguesia que não passam na TV).
O grande ponto que distingue os populistas dos democratas é a subordinação da sua acção política às estruturas partidárias, como se pode observar na total identificação de medidas de gestão autárquica perfilhadas entre os candidatos renegados e os candidatos oficiais dos partidos.
O problema do regime não será a forma como os políticos vendem a causa pública em troca de apoios, mas a forma como essa venda escapa ao escrutínio das lideranças partidárias.
A partidocracia blinda-se.
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