sexta-feira, dezembro 07, 2007

Constituições e a Paz Regicida











Caro Rui,

Não esperava tanta acidez. Então no que toca a mandar-me fazer leituras (de Hayek e Popper) parece-me de uma soberba desproporcionada. Até parece que são alguns autores exóticos...
Logo a mim que tanto gostei do "post" sobre a forma como na blogosfera ninguém consegue discutir sem recorrer ao insulto a a argumentações insultuosas... Adiante.

Devo dizer-lhe que fiquei abismado com as suas respostas. Se acha que é curta a ligação entre Burke, deMaistre e Maurras, bem como Haller, Muller ou António Sardinha, não posso fazer nada. É claro que não vou responder na mesma moeda, recomendando leituras de Sternhell, Pappin, Stanlis ou qualquer dos que não embarcam no Burke "maquiavélico-de-trazer-por-casa" da tradição "whig" e que nunca conseguiram explicar porque é que Burke via na Revolução Francesa "o mal encarnado".

Quanto à ideologia e a Oakeshott a questão é de uma simplicidade atroz. Afirmar que uma sociedade deve ser democrática e encontrar nisso elemento de inclusão ou exclusão de um argumento é ideológico e o predeterminar da discussão a uma finalidade, o que corresponde, precisamente ao erro do racionalismo e dos apriorismos que são denunciados no "Rationalism in Politics" e no “Politics of Faith, Politics of Skepticism” (e, para além disso, refutados em todo a obra de Burke, mas isso fica para outra ocasião).
O que não é de forma nenhuma aceitável é que o Rui apresente como justificação para a teoria de Oakeshott as teorias de Hayek e Popper.

Quanto à questão do constitucionalismo, é também muito claro que a concepção de Constituição de Burke e Oakeshott é claramente oposta à concepção moderna. Tanto Oakeshott como Burke defendem Constituições não escritas, seguindo o conselho de Aristóteles, que se consubstanciou na tradição britânica. Burke critica toda a Constituição que tenha de ser aprovada, pelo simples facto de que isto implicaria que a sociedade poderia existir sem os seus princípios essenciais. Uma sociedade que escolhe os seus princípios segundo a sua vontade é uma sociedade que não tem liberdade, porque tem a possibilidade de escolher a servidão. Ao escolher a Vontade como seu fundamento, ao invés de princípios imutáveis, abre-se a porta a outras vontades, nomeadamente a Vontade de possuir a propriedade dos outros, constitutiva do Socialismo. Não perceber isto na obra de Burke, é não compreender o interesse da obra de Burke, tanto para liberais (compreender os limites do liberalismo) como para conservadores (compreendendo o lugar dos princípios na estrutura da sociedade). Esta questão não se verifica apenas nos escritos sobre a Revolução Francesa de Burke, mas ao longo de todos os escritos sobre a Índia, Irlanda e América. E é nítido que a posição Constitucional de Burke é mais aproximada da do miguelismo não apenas por esse facto, mas porque, para além disso, consagra o lugar da Religião como elemento essencial da Constituição, consagra o Fundamento Moral da Comunidade.

Quanto a Oakeshott a proximidade entre a concepção de Constituição do miguelismo ainda é mais próxima, mas por razões diferentes. Em Oakeshott qualquer Constituição elaborada com um propósito, seja ele democrático, liberal ou outro, é uma excrescência, porque só pode emergir ordem através das interacções das várias partes da sociedade, como foi observado anteriormente. Só uma constituição “crescida” e não “criada” pode ser oakeshottiana, porque só esta ordenação pode ser, de facto “política” (ser um processo de negociação espontânea e não orientada) e é também por isso que uma constituição nunca pode ser analisada (da mesma forma que na teoria hayekiana o mercado nunca pode ser compreendido, por não ter um desígnio e ser uma ordem espontânea).

Lamento que o RA não tenha percebido o que eu escrevi sobre a Constituição. Mas também não vale a pena ofender e mandar alguém para sítio tão feio (o 1º ano de Direito!!!). Estranho apenas a forma como o RA parece imputar aos miguelistas a inexistência de uma Constituição, quase tanto como o desconhecimento de que os burkeanos portugueses da época se encontrarem ao lado da causa de D. Miguel.

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