sábado, maio 05, 2007

A Filosofia Contra o Senso





















(na imagem: a tendência para o bem que há em todos nós)


Um dos pontos de partida da obra de Voegelin foi a estranheza que lhe causou a aceitação acrítica e não fundamentada da Democracia pelos seus colegas de todas as ciências (das físicas às sociais). Rapidamente percebeu que o problema estava nos limites da ciência que estes tomavam por certos e dedicou-se à criação de uma “ciência nova” que não operasse a partir da loucura da distinção entre factos e razões.
Uma das primeiras compreensões sobre o assunto foi de que os factos comportam em si toda uma teoria prévia, que lhes permite fazer esses julgamentos. O facto é um mito, como defendeu McIntyre e é sempre observado à luz de racionalidades (o que o escocês chamava “tradições”). Todas os actos humanos estão a elas subordinados e por elas enquadrados.

O mesmo se passa na Política, onde a neutralidade e a ideia de que a acção se sobrepõe às ideias, o legado da Modernidade, esconde uma submersa concepção profunda. Essa neutralidade, ou objectividade, assim como a ideia de que esse enquadramento é um domínio que escapa à ciência ou a uma racionalidade analisável, criou a ideia de que a acção sem uma compreensão da realidade é possível.
Em boa verdade tal situação é possível, mas apenas dentro de um “espírito” ou de um enquadramento em que apenas existe o “caos”. As construções que as permitem não são poucas... O nominalismo e a incompreensibilidade do Bem que reside no Deus de algumas concepções religiosas, a construção do Homem e da Comunidade como possuidores de papéis divinos, a ideia de tudo é divino ou nada é divino, são apenas alguns desses caminhos.

Onde o debate político é exterior, ou não enquadrado pela filosofia, onde a racionalidade não é passível de análise, fica o momento em que a catástrofe está a cada esquina, meramente impedida pelo Bom-Senso. Se não tivesse existido o Século XX poderíamos ainda crer nessa centelha, nesse resíduo do Bem que que se encontra nos homens. Infelizmente os exemplos de maior amoralidade vieram do povo europeu mais repleto de deontologia. Fixado nesse elemento não analisado de senso-comum, o povo alemão permitiu o massacre, o roubo, a substituição do governo humano por um líder semi-divino.
Se nenhum povo existe sem senso-comum, também é verdade que o Bom-Senso só existe onde existe o Bem, e onde o político e o social o fizeram.

O Poder é natural, mas não é natural que seja o fim de si mesmo. Quando a Política é auto-referencial não há esperança. Dizer que um político quer resolver os problemas das pessoas é uma falácia para caçar tolos. O que são problemas para ele? Se eu me queixar de que não sou milionário o político vai resolver o meu problema? E o facto de eu não gostar dos meus vizinhos? E o sujeito que se quer casar com um cão?
É evidente que a própria concepção do que é um problema político e do que não é, já é, em si, uma definição do papel do político, uma concepção moral, um reflexo de uma posição metafísica. Seja nos casos em que o político resolve, como nos casos em que não, a acção política corresponde sempre à atribuição de um valor.
Por que é que o problema do emprego não é resolvido com o extermínio de segmentos da população? Há dúvidas de que tal iria resolver o problema?

A loucura está na não definição do Bem do Senso, na deontologia apriorística que comporta incapacidade de analisar das finalidades da sociedade.
Sem pensar o Bem e sem a ordenação da política com vista a esse fim, viveremos sempre com os pés no abismo.

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