quinta-feira, março 22, 2007

Os Limites Orgânicos da Aceitabilidade Democrática























Muita gente fica surpresa quando lhe digo que não sou contra algumas formas de "governo popular". Não sou contra algumas concepções de democracia porque não acredito que exista, em si mesmo, um regime melhor aplicável a todo o tempo e em todo o lugar. A forma não é independente da matéria, sobretudo porque está relacionada com uma finalidade interna que é dependente das finalidades da comunidade. De imutável há apenas o Bem, aquilo que não se encontra debaixo do Sol...

O problema está no sentido das palavras, como sempre. Quando falamos de Democracia podemos fazê-lo em vários sentidos. No sentido tradicional e aristotélico o poder democrático estabelece um regime que se funda apenas na vontade dos indivíduos, que se justificam para tal nos iguais direitos de cidadania (a liberdade). Esta ideia é prosseguida na concepção de Rousseau em que para que um regime se considere lícito basta que o Poder englobe a vontade de todos os cidadãos, unidos por essa característica dos homens livres. Esta Democracia é de tal forma existencial ou ideológica que não reconhece, antes se funda na concepção, de que nada pode existir numa sociedade para além da vontade dos cidadãos.

A esta Democracia opõe-se a República, o regime constitucional de governo popular, que se funda na existência de um Poder limitado por instituições e princípios de vida em comum. Na formulação moderna o regime republicano é, muitas vezes, confundido com a Democracia. Quando se afirma que a Democracia se caracteriza pelo “rule of law” e pela existência de um conjunto de princípios de direito impossíveis de derrogar pela lei e pelas instituições, estamos a falar de um princípio republicano e não de uma Democracia em sentido verdadeiro. Onde as leis são perduráveis e fundadas em mais que mera convencionalidade entre indivíduos livres, estamos a falar de uma forma de governo constitucional, tal como foi apreendido à luz dos clássicos pelo republicanismo americano, devotado à sua própria idée directrice, reflexo da sua história e condicionalismos (verdadeiros traços definidores da estrutura da matéria do regime, os cidadãos).

Esta conceptualização é importante. Pode haver um regime (forma política menos degenerada) onde todos são responsáveis pela decisão política, sem que se perigue a existência dos pressupostos comunitários. Nela as partes actuam dentro de um enquadramento comunitário que lhes é prévio e que as estruturam.
Esse fundamento de organicidade, oposto ao atomismo, uma concepção justificadora de um livres e iguais que pode ser subvertido pela própria cedência da liberdade (própria ou de outros), é a linha que separa a República, regime de todos em que é possível a liberdade, da Democracia, situação em que o único limite é o desejo e a força.

A Democracia é inimiga de qualquer lei incontrovertível e portanto inimiga de qualquer Liberdade.

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