terça-feira, janeiro 27, 2009

A Religião como Braço Transcendente do Poder


“Se Deus criou o Homem racional e com tendência para racionalizar tudo o que observa à sua volta, por que não poderá uma concepção racionalista da política estar próxima e/ou ter como guia os valores do Catolicismo e do Cristianismo de forma geral?O Deísmo protestante terá nascido por geração espontânea, ou ele não será mais que uma herança cristã-católica, mas descentralizada da hierarquia de Roma, para criar uma sociedade com valores morais consistentes e objectivos que deram origem uma sociedade próspera ampla e profundamente religiosa? (Tendo nós como exemplo flagrante os primeiros colonos dos EUA, Canadá, Austrália e Nova Zelândia.) Por que haveria Pera, pretendendo ele "uma Europa cristã" de ignorar o legado pós-Reforma? Será a visão sectária de cada uma das Igrejas cristãs aquilo que poderá ajudar a edificar uma Europa e um mundo cristãos?” - Pedro Félix -


Parece-me que o Pedro Félix confunde racionalidade com racionalismo, sendo isso que está a prejudicar a compreensão do problema. A racionalidade faz parte da Tradição Cristã. Poderá alguém dizer que São Tomás não era racional? Pode-se dizer que não é racionalista, ou seja, não acreditava no materialismo, em que os factos e a materialidade seriam a chave para o conhecimento, numa representação de um Deus encoberto e revelado pela Natureza e não pelo Sobrenatural. Ou seja, racionalismo e deísmo são incompatíveis por completo com o Catolicismo e a sua visão sobrenaturalista do mundo.
Ora o Pedro Félix comete aqui um segundo equívoco. O facto de achar que pelo Deísmo vir do Cristianismo é compatível ou o mesmo que este. Tal não corresponde à verdade, porque o papel que é atribuído à Tradição é relegado para um papel contingente e o conhecimento de Deus passa a ser um "direito humano", em vez de uma prerrogativa dos que acedem ao espiritual. No meio de tanta "objectividade" a única coisa que o protestantismo conseguiu produzir foi um deus para cada cabeça. A religião da dúvida ou da Razão... E então o Estado veio com os seus Direitos Seculares e Força ocupar o lugar do Certo e Errado. Ora, pode o PF dizer que essa visão gerou mais prosperidade, mas essa é uma categoria que não é moral. Se acredita que a prosperidade é uma categoria moral, acredita que "might is right", uma expressão evidente do Mal e anexa o certo e errado às cotações da bolsa, ao resultado das guerras, a uma corrida de cavalos.
Há um problema central na identidade que interessa reflectir. Nenhuma pessoa pode ser simultaneamente uma coisa e o seu contrário... Ou seja, uma entidade não pode ser simultaneamente naturalista e sobrenaturalista, nem deísta, maçónica, laica ou agnóstica e Cristã, da mesma forma que não se pode ter um metro 1,64m e 1,87m. Quem aceita este tipo de identificação contraditória é porque tem na identificação uma arma para projectos políticos. A religião como braço transcendente do tal “might is right” pode ser muito útil, mas é o contrário do que deve ser a Religião – a procura da ordem das coisas e a reordenação da alma segundo esse princípio. Isso não é mais do que Ideologia.
O Pedro Félix fala do sectarismo das igrejas cristãs do ponto-de-vista de quem não acredita em nenhuma. Só assim se explica que prefira o Poder do Cristianismo, à sua Verdade. É que é preciso ser muito imaginativo, ou ver o Cristianismo de muito longe, para não perceber as insanáveis diferenças no seu seio. Para as esquecer com desejo de mando, o problema já é outro e mais profundo.

Etiquetas: