terça-feira, outubro 28, 2008

Amor Sem Cristianismo

















O Modernista deixou no Portugal Contemporâneo um artigo (em duas partes) com várias achegas para o problema do Casamento que tem vindo a ser tratado por mim e pelo Rui A. do Portugal Contemporâneo. Uma discussão muito interessante, mas que, ao contrário do que seria de esperar, em vez de ter cativado os blogues que se dizem conservadores, de direita e católicos, não tem recebido qualquer contributo de fora. Um sintoma não de falta de capacidade, mas de como muita gente só diz o que pensa dentro de quatro paredes, com medo de não chegar a Secretário de Estado. As pessoas definem-se, de facto, pelos seus fins…

O texto apresentado pelo Modernista é curioso. Não apenas porque radicalmente oposto à forma como me habituei a vê-lo, não apenas porque apresenta como elemento fundamental um substrato jusnaturalista cristão e uma rejeição da neutralidade liberal, mas porque apresenta uma cratera. Uma cratera que se encontra repleta de uma intencionalidade cristã, que embora muito me alegre, ainda é, contudo, insuficiente.

O primeiro problema é a ascese. No ponto 1 do texto é apresentada a libertação extra-corpórea da essência humana. A capacidade que o Ser Humano tem de subordinar as suas necessidades físicas. Esta não é uma descrição boa da doutrina platónica da Alma Humana, porque as necessidades físicas não são dependentes dos fins. São dados que devem ser aprovisionados, como comida numa viagem, mas que devem estar ordenados com Justiça na Alma. A satisfação das necessidades deve ser feita, na medida em que permite a obtenção dos fins, não havendo uma antinomia entre o prazer (corpo) e a felicidade (espírito), mas uma ordenação do espírito dos prazeres do corpo. O desejável é que o homem tenha perfeito prazer na satisfação do espírito.
Este é um ponto muito importante, porque o que determina que a homossexualidade seja uma prática errada não está na satisfação do desejo e na obtenção de prazer, mas na descoberta de fontes de prazer que afastam o homem do seu destino.
Aí está um erro de percepção do Modernista. Platão e Aristóteles, reconhecidos homossexuais da História, defendiam que a mais profunda amizade (forma de amor) que poderia existir seria entre os que partilham a busca noética. Essa homossexualidade é reflexo de uma partilha mais profunda (lá se vai o argumento nº2 da parte 1…). Como se poderá afirmar que a homossexualidade é condenável segundo um paradigma platónico-aristotélico de ordenação dos fins, se esta representa a essência do “amor”? Simplesmente não se pode, sem penetrar no argumento Cristão e ajuntar a essa tradição o tomismo (como através de uma interpretação abusiva da separação entre Lei Eterna e Lei Natural, o Modernista tenta no Ponto 2) …

É o Cristianismo que cria o Amor (enquanto termo unificado) e que reúne como elemento essencial de uma vida no sentido da Natureza Humana a capacidade reprodutiva e erótica, a função crematística e de estabilidade da propriedade, e os preceitos da vida moral como elemento altruísta (amores esses que estavam dispersos na concepção clássica entre Eros, Philia, Ágape). Querer falar da ordenação da Alma sem explicitar como esta é uma forma específica, histórica e determinada por uma concepção autoritativa e não um sentimento auto-evidente ou um afecto difuso é um erro que custa caro e que conduz a que qualquer afecto possa ser considerado como amor. Este erro conduz à mácula do texto do Modernista. Ao não explicitar que o Amor a que se está a fazer referência é uma concepção Cristã, poder-se-á fazer o que se quiser dos afectos e até mesmo exprimir como afecto a vontade de fazer mal, como numa comunidade “Sado-maso”.

No restante, o Modernista reafirma o que há muito tem sido o combate deste Pasquim. Que a comunidade precisa de uma concepção de Bem para ter Justiça (e que esta não significa a repressão do Pecado, mas a procura de uma ordenação que faça florescer a virtude), que tal impõe uma acção benevolente e terapêutica sobre os que se afastam do Bem e vêem a Alma desordenada. E que o liberalismo possui as duas concepções, embora o faça de uma forma ridícula e afirmando uma neutralidade e a-teleologia que são ilógicas e que apenas reduzem a justiça a um desejo personalizado, a expressão mais gritante de qualquer injustiça. È uma grande alegria estar lado-a-lado com o Modernista no combate pela Justiça da Alma e da Cidade.

Mas será que ainda é possível manter esse nome?

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