quarta-feira, setembro 28, 2005

Uma Teoria Para Hoje (I)

Posicionamentos









Qualquer teoria política parte sempre dos problemas do tempo que vive. É sempre uma resposta a uma pergunta, um posicionamento perante uma questão, uma solução. Talvez por isso a asserção de Prezzolini tenha maior importância do que anteriormente. As direitas têm forçosamente de ser mais do que reacções à esquerda, sob pena de enfileirarem na reacção. Essa é a grande distinção entre as direitas... Uma direita quer ser direita, encontrando por isso justificações nas várias teorias que compõem os seus argumentos. Se a esquerda é igualitária a direita é hierarquizada, se a esquerda é utópica a direita submerge no existente, se a esquerda é emotivista a direita é esfíngica[1]...
Elabora-se uma síntese de crenças, um acervo da direita, um manifesto, e defendem-se as ideias do ponto-de-vista “estas são as nossas”!
É esta concepção ideologizada que afasta a direita do “real”, tornando-a numa ideologia, numa forma de pensamento pouco diferente do que é ser esquerdista.
A direita seria uma força social de estrutura mental em forma de “pronto-a-usar” contra a ideologia de esquerda.
É este o pensamento que encontramos na totalidade da direita partidária do nosso país. É por natureza uma via partidária e social...

Há uns tempos escrevi por aí que o objectivo da direita deve ser o centro. Não falo de apoios e classes, estratégias e blocos, mas de um centro como proposição de um critério, de uma perspectiva que permita aferir desvios... Uma verdade!
Quando Aristóteles reflecte sobre as problemáticas sociológicas da cidade e dos seus conflitos (Política III-V) postula sempre dois blocos antagónicos. Os democratas que se fundam numa concepção de direitos igualitária e abstracta (iguais porque livres) e desprezando as estruturas institucionais as querem rever segundo a sua vontade e o partido oligárquico que se escuda nas instituições existentes, nas desigualdades materiais, em direitos convencionais e positivados.
Como se vê ambas as formas de governo que Aristóteles apresenta são degeneradas[2]. Falta a ambas uma capacidade de se questionarem, de encontrar o fundamento último, de encontrar respostas profundas que revelem a profundidade da alma humana. Um afirma que tem capacidade de dispor de tudo o político porque este domínio lhe pertence. Outro afirma que o instituído defende a funcionalidade da sociedade[3].

Aristóteles refere outro estrato de quase inexistente expressão social, mas possuidor da capacidade de buscar os fundamentos, ferramentas essenciais para quem quer viver segundo a virtude e a justiça. Um estrato separado dos simplismos de facção, inteiramente devotado à cidade, um estrato capaz de ver além da superficialidade das formas (legislativas, convencionais, sociais) a essência das coisas.
Só percebendo que uma constituição é uma ideia superior às normas que nela estão inscritas, que a essência das coisas, que fundamenta o seu ser, é muito mais do que se encontra inscrito na desordem das nossas vontades, é possível escapar das dicotomias opinativas e da besta do sectarismo. As ideias, como no aforismo de Rodrigo Emílio[4], vivem em planos superiores aos nossos e a sua verdade é independente do grupo que as defende. Por isso nunca poderá ser “direitismo” a ditar as ideias, mas as ideias a determinar o credo e o posicionamento.


[1] Estranhamente nunca observámos um desses direitistas defender a existência de tribunais e leis especiais para cada classe social. Se a direita fosse a defesa da diferença e a esquerda a da igualdade não faria todo o sentido que a direita mais extrema defendesse a existência de um maior número de ordenamentos possíveis num país? Ou a distinção é inútil ou não há direita sobrevivente... Será mais direitista quem vê mais distinções na sociedade?

[2] Segundo a perspectiva aristotélica tirania, oligarquia e democracia são regimes corruptos, por não representarem o Bem Comum mas interesses privados.

[3] Interessante analogia poderá ser realizada em relação aos partidos da “direita” portuguesa que se inscrevem na doutrina populista (socialismo), mas que se tornam liberais devido às necessidades do progresso.

[4] “Não é a gente que tem de mudar de ideias, são as nossas ideias que têm de mudar de gente”

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