quarta-feira, novembro 10, 2004

Eterna Identidade Portuguesa

O desafio que é ser nacionalista hoje é muito superior do que há tempos atrás. A ideia continua, contudo a ser uma opção óbvia para todos os que são gente com chão, chão com alma.
Fosse só um bocado de terra, fosse só o facto de ser minha, e o mundo regrediria ao tempo do “banditismo”, das cidades sem justiça, da pirataria sedentária, da pilhagem de Estado. Esses tempos passaram pois cresceu no espírito dos homens a necessidade de descoberta, que os conduziu à mais sublime descoberta do Homem, a Justiça.
Esta pequena palavra conseguiu fazer emergir o Homem da escravatura de suas vontades, ao fascínio pela “justa medida”. A Justiça é a mesma, o que significa que é una, intemporal.
Os néscios que por aí pululam, que não conseguem perscrutar a intemporalidade das essências, que as derrogam como realidades situadas, fazem melhor em seguir os conselhos de Corção e, no processo, desamparar-me a loja. Dizem muito de si mesmos com as primariedades aprendidas com os Saramagos que, avidamente lêem, e com quem aprenderam a sintaxe.
Portugal tem uma identidade familiar. Uma identidade que a forma, que lhe dá o impulso para a sua realidade existencial. Felizmente a identidade não se esgota no nascimento (como alguns querem fazer, criando uma cristalização da identidade, resumindo o filho aos pais, atribuindo um falso progenitor à criança).

A civilização portuguesa é uma unidade que abarca todo um passado, traços genéticos de civilizações anteriores, que se foram apurando e depurando, numa experiência de vida conjunta em que o acervo genético, filosofia grega, direito romano, religião judaico-cristã, costumes visigóticos, se misturou com a arte e a cultura árabe e magrebina, numa tentativa de se realizar em maior completude, de prosseguir a sua narrativa histórica. A sua essência, uma construção histórica, que ultrapassa em larga medida aquilo que a gerou.

Por isso a nossa música não é a mesma de 1129, ou 1498. Mudámos muito…
Nalguns casos mudámos para melhor (fado, Madredeus), nalguns casos para pior (Emanuel e Delfins), noutros casos para um sabor diferente (música popular brasileira).
A gastronomia mudou impressionantemente de 1143 a 1500. Qual o tempo que é preciso para que seja comida portuguesa? Não será a chamuça um prato português, por uso e costume? Que não se duvide que a chamuça portuguesa e goesa é absolutamente distinta de todas as outras…

A capciosa tentativa de fundar um projecto europeu numa qualquer semelhança europeia de uma identidade originária é não só uma amputação cultural à Pátria, como sintoma de uma concepção abortada de identidade que delimita o Homem como mero resultado de uma herança (ideia que é oposta à ideia de uma filosofia), que o oprime.
É por isso que muitos dos que perfilham esta visão geneticista da identidade, da identidade do nascimento (cor de cabelo, pele, olhos) como algo que define a totalidade do seu ser, se encontram manietados na construção de um pensamento filosófico coerente e se refugiam, em ultima análise no “sim porque sim”.

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