quinta-feira, fevereiro 09, 2006

Da Unidade das Tradições

(Dedicado ao Je Maintiendrai)

O Direito é uma disciplina que sempre me intrigou! Nunca compreendi as suas longas argumentações, as definições elegantes, mas circulares, a certeza das suas formulações.
Nos países onde se pensa pouco e o espírito é servil, o Direito é solução mágica, um horizonte máximo onde os positivismos se encontram em apoteose.
Não é que o problema nunca esteja no Direito. O NOSSO problema, contudo, é bastante mais profundo! O Direito é a expressão de coisas mais profundas, a cristalização de concepções mais profundas. Para os que não conseguem abarcar a totalidade de um problema ela apresenta-se como a camada superficial, muitas vezes reveladora, que ajuda a distinguir o aceitável, mas não define nada mais profundo que isso.

O que as palavras e os conceitos jurídicos significam tem uma raíz na reflexão sobre as coisas (uma construção cultural). É a capacidade de pensar as coisas que nos preocupam, em tempos em que o subterfúgio do relativo e subjectivo nos atiram para o vazio individualista ou a gregariedade animal, que é importante pensar as coisas para além dos “significantes”.
O direito, como disciplina normativa e não ciência, não fornece qualquer resposta a uma reflexão sobre a política. A cidadania não se faz de leis. A obediência não se faz de leis, mas de justiça.

Assim qualquer tradição político-jurídica se insere numa perspectiva mais ampla. Ao contrário do que é hábito dizer-se “a primeira tradição de algo é não existir”, a tradição primeira é o que sempre existiu! A busca das “coisas permanentes” é a tradição primeira do Homem!

Não existe, em boa verdade e por essa razão, qualquer oposição da tradição jurídico-política portuguesa com a perpectiva jusnaturalista que aqui perfilhamos e tentamos demonstrar. Se por um lado colocamos limites morais à “positividade” não é de forma derrogatória. Instituições, leis e sucessões são convenções que encontram a sua vitalidade no cumprimento do Bem, a realização mais perfeita do Ser Humano. A Ideia do Bem é guia, limite, horizonte da acção política, o que não significa que seja possível viver sem leis perenes, instituições duradouras que se destroem à mínima discordância.
Como discutir uma sucessão hereditária sem entrar no domínio do Convencionalidade, sem conhecer as leis próprias que a regem, as suas inibições, o acervo de obrigações que um Rei aceita por virtude da sucessão?
É contudo impossível também fazer uma pedagogia de restauração, da obediência, ou da liberdade, sem recorrer a uma concepção própria do Bom.

Resulta o que digo, por fim, na indissociabilidade das duas Tradições!
A montante a grande tradição Jusnaturalista, Eudemonista, Cristã, concepção que perpassa e enforma a perspectiva jurídico-política portuguesa, que se encontra a jusante.

O problema do direito sempre foi a forma como nas palavras que escondem a Tradição serviram para esconder outras coisas. Uma deturpação na Revolução, um capricho na Modernidade, o Nada na Pós-modernidade.

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