sexta-feira, janeiro 27, 2006

Mais Monarquia

A acrescentar ao texto do Misantropo sobre a Monarquia e a sua sujeição ao Bem Comum devo dizer que ela se perfila como a grande solução para atitude do Jansenista.
Achar que não se precisa de um guia é um erro crasso, uma profissão de fé racionalista ou uma aceitação de que nada existe para além da vontade individual... Em ambos os casos trata-se da aceitação do paradigma liberal de que a vontade e o indivíduo é reduto essencial da vida de uma comunidade.
A ideia conduz aos individualismos e aos atomismos que geram os totalitarismos e a sociedade descriterializada.

Como bem viu Cícero, um conservador da monarquia europeia ainda antes desta existir, a instituição surge como baluarte da preservação da comunidade política das investidas do Povo e da Oligarquia. Do conflito entre os pobres e os ricos, que como Aristóteles já havia notado na Política III se cristaliza na oposição entre a Liberdade e Necessidade (recursos), tem de emergir uma Justiça. A Justiça não é mais que a medida (não uma medida geométrica) onde se encontra vertida politicamente a Ideia de Bem, socorrido pela Prudência.

A vantagem da Monarquia é constituir-se como uma magistratura independente (não-neutra) que zele pelo Bem Comum. Desapegado da necessidade material o monarca tem a capacidade de observar a causa pública desinteressadamente. O Poder monárquico possui a qualidade de ser um obstáculo às vontades das partes em conflito. A Monarquia apresenta-se, precisamente por esse facto, como a guardiã da Constituição, uma vez que foi sobre ela que se constituiram os acordos que permitem a constituição de uma Comunidade Política e a sua sedimentação e formação numa Nação.

Esse é um Poder absolutamente diferente da concepção do “Patriarcha” que percorreu alguma literatura proto-moderna (Filmer), disposta a equiparar o poder do soberano ao poder paternal ou patriarcal-tribal. Esta concepção absoluta da realeza, muitas vezes transbordando para o domínio do privado, não é a natureza própria da monarquia europeia! Por ser um condicionamento à Vontade Popular não pode, de forma alguma, ser fundada em actos de “livre voluntarismo”. Como já escrevi os corpos sociais não elegem um Rei (o que seria um contra-senso segundo as tradições do nosso povo), mas encontram-no (no caso de não existir sucessão imediata) tendo como “luz” as antigas leis e prerrogativas, submetidos a uma ideia de colectivo “Bem Comum”.
É precisamente essa ideia de superveniência face ao poder popular que deve afastar o Rei de eleições ou de plebiscitarismos. Constituíndo-se como garante da Constituição da Nação é impossível que este seja vinculado por vontades populares que a poderiam subverter ou tentar dominar. Vem daí a minha incapacidade de reconhecer uma monarquia legitimada popularmente(tanto do Prof. Castro Henriques, como do Prof. Maltez, como do Arqº. Ribeiro Telles) uma vez que é esta não-electividade que a torna importante e que torna útil e possível (face à unidade do Poder) a existência de vontades políticas variadas, mas subordinadas ao Bem Comum.

É em cada plebiscito que encontramos as legitimações carismáticas, os cesarismos e bonapartismos, que olham o Homem de forma paternalista e utilitária, explorando as paixões dos homens de modo à sua subversão.
Como Voegelin nota em As Religiões Políticas na subversão de Akhenaton, da mesma forma que Burke o faria em relação ao jacobinos nas Reflexões, a exploração do despotismo das vontades conduz a uma desumanização, a uma concepção do transcendente que é impossível de compreensão racional (Strauss considera o mesmo quando se refere ao voluntarismo de Rousseau como justificação central para a comunidade política). Não tendo capacidade para aferir o que é justo ou injusto o homem não tem capacidade para nada que não seja a submissão completa e total...
O que é o carisma weberiano senão uma forma de desligar a acção política da sua racionalidade moral?

O que é a monarquia senão a instituição com o intuito de preservar a comunidade de si própria e dos que consideram a "razão" e a "vontade" parcelares?
O que é a monarquia senão a expressão de que o Bem Comum não nos pertence?

A Monarquia é muito mais...

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