sexta-feira, abril 15, 2005

A Incapacidade da Ciência[1]

Quando Comte fez a sua apologia do cientismo-positivista fê-lo como uma reposição do Antigo Regime. A ideia era evidente: substituir a fé cristã por uma fé materialista, onde a técnica seria a Revelação, onde os cientistas seriam os místicos sacerdotes!
Onde a ciência (a verdadeira) punha questões, a nova ciência dava respostas. A ciência perdia o seu papel dialético, para ganhar pendor doutrinário.
Rapidamente a ciência passou a ser sinónimo de positivismo, de materialismo. Daí que muitas vezes ouçamos os biólogos, os físicos, os químicos, os médicos mais incautos, dizer não acreditarem em religiões, por serem “homens de ciência”.

Ao esconder-se de tudo o que fosse externo ao observável, a “ciência” considerava alcançar verdades cartesianamente inabaláveis.
A verdade da “religião científica”, a redução de tudo o que existe a causas materiais observáveis, apresenta-se, contudo, absolutamente circular. Explicar que um isqueiro se acende por causa de uma reacção de partículas pode ser verdadeiro, mas não explica a causa final. Como Chesterton bem observou, se tentarmos justificar alguma coisa com base apenas no materialismo, redundamos numa sociedade incapaz de viver.
Se me perguntarem “porque é que mataste o homem?”, eu não poderei responder “porque o meu cérebro emitiu estímulos eléctricos, que moveram os músculos da minha mão, que desencadeou uma reacção na pólvora da arma, que fez sair o projéctil da arma, que atingiu um órgão vital da vítima”!

O que acontece é que a ciência é a busca persistente de razões. Quando a ciência cessa de buscar essa dimensão mais profunda, torna-se proposta de verdade (ideologia, religião). Quando alguém diz que conhece as razões por que existe a combustão espontânea e que esta exclui a existência de Deus, está a fazer religião! Quando alguém diz que o homem se move apenas e sempre por interesses económicos, está a fazer religião! A ciência é a justificação do saber. Nada mais…
Quando a ciência deixa de ser o aprofundamento da observação (do elemento ao átomo, ao protão, ao “quark”) e passa a ser teorização e filosofia (“tudo o que existe é água, ou átomo, ou forças positivas e negativas, ou matéria). Uma filosofia circular e amputada.

Utilizando o exemplo da Ecologia se pode observar mais facilmente a insuficiência da ciência no espírito humano.
A Ecologia pode fazer um cálculo de regeneração dos recursos, mas não pode dizer ao Homem que este aquele ou aquele outro “objectivo de sociedade” é melhor que o outro.
Pode dizer que se não paramos de poluir poderemos matar a vida toda dos mares. Mas não pode fazer nada se eu disser que prefiro viver num mundo sem peixes… Ou se eu disser que o homem é um ser natural e que a extinção da competição de todos os outros animais é algo que obedece à natureza!
Por isso é necessária a ciência de Platão, Aristóteles, Vico…
Uma ciência do Bem.


[1] Sobre este assunto recomendo vivamente a leitura de três textos, que apesar de não serem simples (os simples que se ocupem de coisas simples) são essenciais para a compreensão da problemática e erros da ciência positivista-materialista.

- A Introdução de “The New Science of Politics”, de Eric Voegelin, que apresenta uma refutação completa das teses weberianas.
- “After Virtue” de Alasdair MacIntyre, que apresenta uma destruição completa da ideia tecnocrática, sob uma perspectiva teleológica aristotélica.
- Os primeiros capítulos de “Orthodoxy” de G.K. Chesterton.

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